O Pedro fala-nos hoje do fim da Polaroid. Este ano termina a longa vida desta máquina de agarrar instantes. Nunca tive uma Polaroid. Já sou do tempo das máquinas fotográficas com flash incorporado, esse prodígio absoluto da técnica que o meu pai trazia lá de longe, do Oriente. Lembro-me de uma Pentax extraordinária que não chegava a enrolar, automaticamente, o rolo fotográfico, mas tinha um ar moderno verdadeiramente irresistível. O que eu usei aquela máquina. O que eu exibi aquela máquina.
Mas tenho um carinho especial pela Polaroid. Porque foi com esta máquina que eu descobri que nunca poderia ser uma princesa. Teria uns cinco anos. Estava em casa de uns familiares onde havia uma menina pequenina como eu. Acho que éramos primas. Também lá estavam o meu pai e a minha mãe. Os adultos conversavam, suponho, e as crianças brincavam, suponho também. Um dos tios, que tinha uma Polaroid, decidiu registar aquele momento para mais tarde recordar. E disso já me lembro muito bem. Porque era preciso preparar o ambiente certo para a foto. Organizar as pessoas – adultos em cima, crianças em baixo – dar um jeito aos cabelos, preparar o sorriso. Clic, a Polaroid deita a língua de fora e sai a fotografia.
É então que se dá o choque. Olho para a foto recém-nascida e percebo que ao meu lado estava uma linda princesa. A minha prima (ou coisa que o valha) tinha um sorriso perfeito, parecido com o das bonecas. Era delicado, bem desenhado, rosado, um pouco brilhante até. E a posição da cabeça e das mãozinhas? A cabeça tombou-a de lado, não muito, sempre na proporção correcta, as mãozitas colocou-as entre as pernitas, uma por cima da outra. Uma princesa.
E eu? Toda eu era um cabelo despenteado, umas jardineiras muito arrapazadas, um sorriso cheio de dentes e muito, muito horizontal. Foi isto que me desgostou. Eu queria ter um sorriso curvado, daqueles dos desenhos animados, igual ao da prima-princesa.
Bolei um plano. Pensei: se ela tem um sorriso assim, eu também posso ter. Basta curvar os lábios. Não sei se me consigo fazer entender. Pensava eu que bastava dar um jeito à boca para conseguir ter um sorriso perfeito, de boneca.
Tentei. Dei um jeito aos lábios e clic, vem a segunda fotografia. E o resultado é verdadeiramente assustador. Queria uma princesa, saiu-me um ogre. Dei um jeito aos lábios, é certo, mas acabei por torcer a boca toda e ficar parecida com um monstro a assustar criancinhas. Um susto, um autêntico susto.
A minha prima? Não comento.
Vem a terceira foto. E eu, que não era estúpida de todo, pensei: “está visto que não tens domínio sobre o teu próprio sorriso, mais vale imitares a posição.” E então pus a cabeça de lado, levemente, e encaixei as mãos entre os joelhos. Ensaiei o olhar mais doce deste mundo e clic.
Não estava mal, tirando aquele sorriso completamente horizontal. A outra estava mais princesa que nunca.
Lembro-me de tudo isto como se tivesse acontecido ontem. Graças às polaroids, que guardei com muito amor e carinho durante todos estes anos na devida sequência.
15 de janeiro de 2009
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1 comentário:
Eu tenho uma Polaroid... E agora, o que vou fazer sem "rolos"? :(
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